sábado, 31 de julho de 2010

"Dá. Há."

Dá para ver o meu entender?
Na voz do teu entendimento
Há algo para ter a haver?
Na carência do teu movimento

O entender de mim na tua voz
É a tua voz de olhar sereno
É longe teres-me parte-noz
O teu olhar na tua voz pequeno

Dá parte de tudo a nós
Na voz do nosso ser sós
Há parte de facto, veloz
Na presença do sentir-pós

de F.J.O.C.

sábado, 24 de julho de 2010

"O Amor e o Poeta" - Fernando Girão

Queria escrever-te um poema de amor
que tivesse palavras como carinho, alegria, cor.
Queria eternizar-te através da minha caneta,
dizer-te o que ninguém jamais disse,
fazer-te feliz para o resto do tempo
que ainda resta, ter-te como exemplo.
Tu és o templo onde eu entro e vou rezar,
queria tanto amar-te e esquecer tudo o resto.
Publicarei manifestos para que o mundo saiba
que o amor opera milagres, que o amor tudo transforma,
que o amor só tem uma norma,
só exige que haja paixão.
O amor anda um passo adiantado
e já o poeta o mesmo não pode dizer,
o amor esquece as guerras,
o poeta fala nelas.
O amor sorri porque existe,
o poeta conta histórias tristes,
não esconde o lado escuro da vida,
põe a boca nas feridas
que fazem sofrer o mundo.
O amor é complacente dentro de um certo limite,
mas se o amor é traído
pode ser mais perigoso
do que um tigre enlouquecido
que alcança o seu caçador.
Aí então o amor
torna-se irmão do poeta
e junta-se à caneta
que escreve as palavras mais duras
e nenhum dos dois atura
essa espécie de tortura
que é ser escravo da dor.

de Fernando Girão
retirado de
http://www.fernandogirao.com/

Tive vida

Tive medo que partisses
Assim como um vazio do luar
Tive receio que chegasses
Assim repentinamente sem avisar

Tive a expectativa do paraíso
Imposta pela vida, pelo caminhar
Tive a coragem séria, fui atrevido
A cegar-me na jornada deste deambular

Tive tempo e ensejo de tudo
Tal foi a entrega de apaixonar
Tive as certezas sempre, mudo
Tal como senti logo o teu amar

Tive futuro em cada momento
Outro caminho não advinhei
Tive vida sem sofrimento
Oxalá venha mais do que esperei

Medo, receio
Expectativa, coragem
Tempo, certezas
Futuro, vida

de F.J.O.C.

domingo, 18 de julho de 2010

O mar revolto e frio

O mar revolto e frio
De vento, água e sal feito
De lá entrar de coragem-brio
Salgado na pele teve efeito

Com luz longe e ar quente crio
A solta vontade e jeito
De saber e ter contigo poderio
Até se ter em nós todo o peito

de F.J.O.C.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

“Sete Letras” - Marisa Pinto


Esta palavra saudade
sete letras de ternura
sete letras de ansiedade
e outras tantas de aventura.
Esta palavra saudade
a mais bela e mais pura
sete letras de verdade
e outras tantas de loucura.
Sete pedras, sete cardos, sete facas e punhais
sete beijos que são nardos
sete pecados mortais.
Esta palavra saudade
dói no corpo devagar
quando a gente se levanta
fica na cama a chorar.
Esta palavra saudade
sabe a sumo de limão
tem o travo de amargura
que nasceu do coração.
Ai! palavra amarga e doce
estrangulada na garganta
palavra como se fosse
o silêncio que se canta.
Meu cavalo imenso e louco
a galopar na distância
entre o muito e entre o pouco
que me afasta da infância.
Esta palavra saudade
é a mais prenha de pranto
como um filho que nascesse
por termos sofrido tanto.
Por termos sofrido tanto
é que a saudade está viva
são sete letras de encanto
sete letras por enquanto
enquanto a gente for viva.
Esta palavra saudade
sabe ao gosto das amoras
cada vez que tu não vens
cada vez que tu demoras.
Ai! palavra amarga e doce
debruçada na idade
palavra como se fosse
um resto de mocidade.
Marcada por sete letras
a ferro e a fogo no tempo
Ai! palavra dos poetas
que a disparam contra o vento.
Esta palavra saudade
dói no corpo devagar
quando a gente se levanta
fica na cama a chorar.
Por termos sofrido tanto
é que a saudade está viva
são sete letras de encanto
sete letras por enquanto
enquanto a gente for viva.

Ary dos Santos

Caminhar

Teu coração bate e pauta minha caminhada
Caminho ao som do meu que dispara
Com o teu olhar-luz a chamar-me
Flutuo sem reservas e alarme
Vôo firme de quem tudo de Ti sente e ama

Quero ficar sem dormir
Preciso não adormecer porque vais aparecer
Quero esperar o teu sentir
Preciso ver-te e respirar-te e ter

de F.J.O.C.

terça-feira, 13 de julho de 2010

O milagre das rosas






























"Romance da Rainha Santa Isabel"

Peço graça com fervor
Do divino Manuel,
Para que haja de rezar
Da Rainha Santa Isabel:
Em Saragoça nascida,
Segundo a oração diz,
Foi rainha mui querida,
Mulher d’el-rei Dom Dinis;
Aos pobres socorria
Com entranhas do coração
Pois de ninguém se fiava,
Sua esmola apresentava
Com a sua própria mão.
Vindo a “santa” um dia,
Com seu regaço ocupado,
Pelo tesouro que havia,
Com el-rei eis encontrada!
«Que levais aí, Senhora?
Levo cravos e mais rosas,
Para mais nossa alegria.
Bem sei que levais dinheiro,
Segundo sois costumada;
Antes que muito me cheira,
Rosas em Janeiro,
É de maravilha achá-las!»
A Senhora
O seu regaço lhe amostrou,
Cravos e rosas achou,
Um cheiro que admirava.
«Ó rainha excelente!
Meu tesouro podeis dar,
Minha coroa empenhar
Porque tudo estou contente.»
Estando a “santa” um dia
Na sua sala sentada,
Chegou-lhe um pobre chagado,
Se o podia arremediar;
Ela lhe disse
Com palavras de amor:
«Mandarei chamar o doutor,
Que vos haja de curar.
Senhora, se queredes
Ter o vosso coração inflamado,
Deitai-me na vossa cama,
Que eu serei remediado.»
A Senhora
De pés e mãos o lavou,
Na sua cama o deitou.
Um cavaleiro, que no paço
Havia encontrado,
A el-rei tudo é contado.
Vindo el-rei muito agastado,
Com tenção de a matar,
Contra a clemência que usava;
Na cama onde repoisava
Deitar um pobre chagado.
A Senhora correu o cortinado,
Achou Jesus crucificado!
Muito chorou o rei com ele
Dos milagres, que ela tinha obrado.
Em Estremoz acabou
Em Coimbra está sepultada,
No convento que formou
De Santa Clara sagrada.

in Romanceiro e Cancioneiro Popular Português

D'hoje

Cheiro teu
Calor aqui
Verdadeiro meu
Amor de Ti

Cheiro teu e meu
Calor aqui, cá em nós
Verdadeiro meu coração deu
Amor de Ti em dupla voz

de F.J.O.C.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Harmonia













Sonho de mim, rodeado da tua imagem
A real bonita harmónica viagem
A ida ao mundo novo do teu viver
O desejado regresso a ti, Mulher.

de F.J.O.C.

sábado, 10 de julho de 2010

"À fuga da vida"

Corra sempre a viver
Corra sempre por tentar viver
Corra sempre por amar
Corra sempre por morrer a amar

Fuja da noite, da escuridão
Fuja de inércia, da submissão

Viva cada dia para melhor
Viva cada hora com mel-sabor
Viva cada minuto a sorrir
Viva cada afago a sentir


de F.J.O.C. ("À fuga. À vida.")

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Há tempo

Há tempo para sentir tudo bem à flor da pele
Tudo, o óptimo de viver pelo melhor
Há vivências raras e inesperadas a granel
Todas elas derivadas das opções do nosso suor

Vai uma hora
Perde-se um minuto
Vem-te embora
Torna-te astuto

Há falta e carência diária que vem
Algumas secas e adversas ao momento
Há solidão segura de dentro, a quem
Tudo o que desejas e dás do teu fomento

Anda agora
Ganha tempo
Antecipa a hora
Pinta o advento

de F.J.O.C.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

"Não sei se é sonho, se realidade" - Fernando Pessoa

Não sei se é sonho, se realidade,
Se uma mistura de sonho e vida,
Aquela terra de suavidade
Que na ilha extrema do sul se olvida.
É a que ansiamos. Ali, ali
A vida é jovem e o amor sorri.

Talvez palmares inexistentes,
Áleas longínquas sem poder ser,
Sombra ou sossego dêem aos crentes
De que essa terra se pode ter.
Felizes, nós? Ah, talvez, talvez,
Naquela terra, daquela vez.

Mas já sonhada se disvirtua,
Só de pensá-la cansou de pensar,
Sob os palmares, à luz da lua,
Sente-se o frio de haver luar.
Ah, nessa terra também, também
O mal não cessa, não dura o bem.

Não é com ilhas do fim do mundo,
Nem com palmares de sonho ou não,
Que cura a alma seu mal profundo,
Que o bem nos entra no coração.
É em nós que é tudo. É ali, ali,
Que a vida é jovem e o amor sorri.

de 30/08/1933, Obras Completas I, Fernando Pessoa

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Canseira solitária

Hoje saí cansado do trabalho mas com a noção do dever cumprido...
Nestes últimos dias, seja saudade ou carência ou do tempo mais ameno de calor, fico com a vontade de me aconchegar a ti o resto do dia, sem mais canseira que me ocupe...
Vim para o meu quartinho, e após mastigar algo leve, deitei meu corpo ao som da nova musica de cá... e deixei-me descansar. Do descanso ao jantar lá se foram duas horas... Despertei, com poucas falas fiquei... não me apetecia falar, não queria incómodo algum, só queria o tal aconchego poder ter de imediato...
Jantei e no meu silêncio introspectivo saí de casa sem destino, um café rápido pensei... Segui sem destino e encontrei-o na escadaria da mata do Menino do Monte de cá, e subi-a só, com pensamentos de nós, ao cair da noite... Escada a escada, imagem a imagem, ideia a ideia de carinho que desejava...
Ao cimo chegado o tal café tomei e logo saboreado logo desci, já à noite sem luar... Sosseguei no passeio sem deixar vir tristeza mas a saudade está em mim, aperta mais o meu mimo...porque é teu o meu aconchego!

de F.J.O.C.